Como Pedro Barros ajudou Florianópolis a ser polo nacional do skate.
A trajetória do primeiro medalhista de prata no Skate Park das olímpiadas, Pedro Barros, é daquelas digna dos grandes: sua carreira se confunde com a história do skate em Florianópolis. Pedro, seu pai, o surfista André Barros, e seus amigos ajudaram a tornar a capital catarinense o polo da modalidade park no País.
A história começou na década de 90 com um sonho de André, Rafael Bandarra e Leonardo Godoy Barbosa, mais conhecido como Léo Kakinho. A meta do trio era transformar Florianópolis na Califórnia brasileira. Na época, a capital catarinense já tinha surfe de sobra em suas dezenas de praias. Porém para se assemelhar ao berço do skate, era preciso crescer essa modalidade por lá.
E foi aí que o trio (pai de Pedro Barros, Rafael e Léo Kakinho) começaram uma história em Floripa. Vindos de diferentes pontos do Brasil, escolheram para morar no pouco habitado Rio Tavares, bairro que se tornaria o grande polo do skate na cidade. A decisão foi estratégica. O local fica muito perto da famosa Praia da Joaquina, dona das maiores ondas de Florianópolis. Eles compraram terrenos grandes a preços baixos e construíram pequenos “bowls”, como é chamada a pista do park.
O bowl parece uma piscina vazia e agrada aos fãs do surfe porque o deslize do skatista por suas paredes lembra o movimento dos surfistas nas ondas no mar. “Vim pra Floripa em busca da Califórnia brasileira. Já era simpatizante do surfe. Também queria estudar. A ideia era surfar de manhã e andar de skate à tarde. E acabamos criando a Califórnia aqui. Veio muita gente de fora”, conta ao Estadão o pioneiro Léo Kakinho, horas antes de ver Pedro faturar a prata no Japão.
O carioca radicado na cidade de Guaratinguetá (SP) brilhou nos bowls do clube Itaguará, famoso na história do skate brasileiro. Lá foi campeão brasileiro amador em 1985. Diante das dificuldades econômicas da época, Kakinho aceitou o convite do amigo Rafael para levar a cultura do skate até Florianópolis.
O projeto foi consolidado com a fundação da Hi Adventure, misto de pousada, local de treinos e clube de amigos, com duas elogiadas pistas. Bandarra foi o fundador, Kakinho contribuiu com o conhecimento da modalidade. Até desenhou as pistas onde Pedro Barros, Yndiara Asp e Isadora Pacheco, todos nascidos em Florianópolis e representantes do Brasil em Tóquio, fizeram algumas de suas primeiras manobras – Yndiara, assim como Pedro, foi finalista na Olimpíada.
“Eles surgiram neste bowl, na pousada. A Isa e a Ynd nasceram ali mesmo. Vi eles crescendo. Não dei aula para eles porque no skate não havia essa ideia de escolinha. Fazíamos ‘sessions’ juntos. Eu dava uns toques neles, algumas dicas. Ajudávamos como podíamos. Todo mundo era meio que um professor. Muitas manobras eu acabei ensinando para eles. Até hoje damos dicas sobre um posicionamento do pé, um encaixe do corpo na manobra…”, afirma o pioneiro do skate de Florianópolis.
Kakinho lembra muito bem como foi o início de Pedro, que viria a conquistar seis títulos mundiais. “Numa noite eu acabei deixando o meu skate na casa do André. Como iríamos surfar no dia seguinte, não ia precisar dele. Quando fui buscar, no dia seguinte, a mãe do Pedro disse que ele passou a noite inteira grudado no skate. Tinha dois anos na época. Só pelo olhar dele, eu disse que viraria skatista”, recorda.
A partir daí, Pedro passou a fazer sucesso na pista da Hi Adventure e atrair novos adeptos ao bairro do Rio Tavares. “O local virou referência nacional. Muitas famílias trazem seus filhos para se hospedar aqui e andar na pista. Antes era apenas um lugar para andar de skate. Agora todos os horários da escolinha estão preenchidos. Virou o maior polo de park do Brasil. E, por causa da Olimpíada, já aumentou o movimento. Foi um impulso muito grande.”
Antes mesmo da medalha de prata de Pedro em Tóquio, o Rio Tavares já vinha concentrando as atenções do skate nacional. No bairro acanhado, que conta basicamente com cinco ruas, é mais comum ver pistas de park nos quintais das casas do que piscinas ou churrasqueiras. São 20 bowls no local, na estimativa de Kakinho, que desenhou 15 deles. São todos particulares. Na cidade toda, ele estima em 50. Sem contar a pistas de street – a maior da cidade já vai passar por reforma.
Um dos motivos do sucesso do park em Florianópolis, na avaliação do especialista, é a facilidade de manutenção. “Antes a moda era o ‘half pipe’ (pistas em formato de U), quase sempre de madeira. O bowl é de cimento, não estraga com a chuva. Então chegou uma hora que todo mundo tinha um ‘bowlzinho’ em casa.”
Os efeitos do crescimento do skate no local são até econômicos. “Crescemos todos com o Pedro: nós, o bairro, a cidade. Economicamente, dá oportunidade para todo mundo. Para o pessoal que constrói pistas, dá emprego nas lojas, na venda de produtos ligados ao skate”, enumera Kakinho, que mora ao lado da já famosa pousada.
Se depender dele, os skatistas brasileiros de elite não precisaram mais ir morar na Califórnia original. “Hoje em dia isso mudou um pouco. Floripa virou um lugar bom para treinar no park e também para morar. Hoje não tem a necessidade de se mudar para os EUA.”